sábado, 21 de novembro de 2015

Ficção Científica e o Ensino de Ciência (FIOCRUZ 2015)

Ficção Científica e o Ensino de Ciência
Mesa-Redonda na FIOCRUZ

201511192359P5  —  20.222 D.V.

 Abertura do PowerPoint.


“Nem toda forma de amor vale a pena.
Paixão é cocaína e amor é rivotril.”
[Ieda Tucherman]

Participei na manhã desta quinta-feira da mesa-redonda “Ficção Científica e o Ensino de Ciência” na Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ) em companhia da Professora Ieda Tucherman, sob o convite das pesquisadoras Anunciata Sawada e Lúcia de La Rocque.
As tratativas para a efetivação dessa mesa-redonda começaram no início deste segundo semestre e somente se concretizaram na manhã de hoje.
O carro da FIOCRUZ chegou para buscar eu e Cláudia pontualmente às 08h30, rumando em seguida para Ipanema a fim de buscar Ieda Tucherman, doutora com quem eu já travara contato em 2005, por ocasião da Semana Jules Verne, seminário que se deu no campus da PUC-Rio sob os auspícios daquela universidade.
Aliás, a mesa-redonda de hoje foi a segunda de que participei na FIOCRUZ.  A primeira foi organizada pela pesquisadora Luísa Massarani e ocorreu de 22 de março de 2004 na Tenda da Ciência da instituição.  Dividi aquela mesa com os autores e estudiosos de ficção científica Bráulio Tavares e Roberto de Sousa Causo.
*     *      *

Nossa condução nos desembarcou por volta das 09h30 junto ao Pavilhão Hélio & Peggy Pereira (HPP) da FIOCRUZ, que se constitui no polo de pesquisa em virologia mais moderno da América Latina.  Anunciata nos recebeu à porta desse centro e nos conduziu até a sala onde se daria nossa mesa-redonda.  À porta dessa sala, reencontrei o pesquisador Cilmar Castro, também especializado na utilização da ficção científica como ferramenta no ensino de ciência, com quem travei contato durante uma mesa que dividimos no colégio EDEM de Laranjeiras em 2014.
Pouco antes do começo da mesa, enquanto o público acadêmico chegava e ocupava seus assentos, conversei com Lúcia de La Rocque e combinei com ela que lhe mandaria uma cópia em PDF de minha noveleta pós-apocalíptica “Postdomini”, publicada na antologia Depois do Fim (Draco, 2013), organizada por Eric Novello.  O bate-papo com Lúcia foi interrompido para que eu e Ieda concedêssemos entrevistas institucionais para Lucas Rocha, que trabalha no jornal de circulação interna da FIOCRUZ.
Entrevista com Lucas Rocha.

Tive oportunidade de rever Naelton Araújo, amigo de longa data que foi meu veterano no curso de Astronomia da UFRJ (Observatório do Valongo).  Responsável pela área de divulgação científica do Planetário da Gávea, Naelton sentou na primeira fila da plateia para a mesa-redonda.

Plateia interessada.

Começamos nossa mesa por volta das 10h20 com minha apresentação em PowerPoint.  Após minha apresentação pessoal e os agradecimentos pelo convite para o evento, abri com a recordação da mesa-redonda anterior, de 2004 e então comecei pelo começo, apresentando algumas definições básicas de ficção científica como parte da literatura fantástica.  Falei um pouco sobre a genealogia do gênero, comentando que a ficção científica é fruto da interação de uma mãe (Mary Shelley) e dois pais (Jules Verne e H.G. Wells).  Esse triângulo literário serviu de gancho para expor as divergências entre os dois “pais” no que concerne ao papel primordial da ficção científica: instruir (Verne) ou divertir (Wells).  Expus então a gênese da FC norte-americana com Hugo Gernsback, um discípulo fiel de Jules Verne.  Abordei a questão da falácia da literatura de antecipação, esclarecendo que a missão precípua da ficção científica não é prever o futuro (campo de atuação da futurologia), mas sim entreter e, quiçá, prevenir quanto às consequências adversas de alguns avanços científicos e tecnológicos.  Concluído este introito um tanto ou quanto longo, mergulhei no emprego da FC como ferramenta de ensino de ciência, tanto lato sensu (divulgação científica) quanto stricto sensu (FC no ensino em si, dentro e fora da sala de aula).  Creio ter conseguido interessar a plateia.

Aos leitores interessados em baixar a versão em PDF da apresentação acima, segue o link:


Lúcia de La Rocque.

Anunciata Sawada.

PowerPoint: Mestres definem Ficção Científica.




Encerrada a minha fala, Ieda e eu retornamos à mesa em si, pois ela não usou PowerPoint.  Ieda concordou que o papel principal da ficção científica é alertar quanto aos riscos inerentes à aplicação inconsequente da tecnologia, colocando que “a ficção científica assume a função de uma espécie de Grilo Falante da civilização, avisando-a quanto aos perigos associados ao emprego de certas técnicas e invenções.  Insistiu na importância da ética na ciência, sobretudo na área das biociências.  Num dos pontos altos de sua participação, Ieda declarou que “nem toda forma de amor vale a pena: paixão é cocaína e amor e rivotril”[1], pois as áreas do cérebro ativadas na pessoa apaixonada são as mesmas que se “acendem” sob o efeito da cocaína, ao passo que o sentimento de amor em si produz efeitos semelhantes àqueles induzidos pelo consumo de rivotril.

Ieda Tucherman e GL-R.

Encerrada a parte formal da mesa-redonda, passamos a palavra à plateia, para comentários, críticas e perguntas.  O público presente participou de forma animada, com discussões sobre clássicos do gênero (de Fahrenheit 451 a Doze Macacos, 2001: Odisseia no Espaço a Eu, Robô, até Dragon’s Egg e o recente Perdido em Marte) e questões sobre o emprego de jogos e quadrinhos de ficção científica em sala de aula; autoras e protagonistas femininas em narrativas de ficção científica; ética na pesquisa; viagens retrotemporais; FC pré-histórica; enredos de história alternativa; e vários outros temas instigantes e relevantes que não me voltam à memória agora.
Finda a mesa-redonda por volta das 13h00, Anunciata e Lúcia nos convidaram para almoçar num dos restaurantes da FIOCRUZ.  Como a instituição possui as dimensões de um grande campus universitário, precisamos embarcar no carro da Anunciata para seguir até lá.  No caminho, nossa anfitriã nos indicou e descreveu brevemente os principais centros de pesquisa da instituição, como o Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos); a Casa de Oswaldo Cruz (COC); o Centro de Criação de Animais de Laboratório (CECAL); a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV, um segundo grau profissionalizante de excelência); e a Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP); além, é claro, do Instituto Oswaldo Cruz (IOC) propriamente dito.
O restaurante em si não ficou nada a dever a uma filial do Delírio Tropical, com direito, inclusive, a uma taça de vinho tinto, além de carnes e massas muito gostosas.  Cláudia optou essencialmente pelas saladas, mas não abriu mão do mousse de chocolate como sobremesa.  Ao longo do bate-papo na mesa reservada para nós, aproveitamos para conhecer um pouco mais sobre as carreiras científicas na FIOCRUZ, sobretudo as de Anunciata e Lúcia La Rocque.  Porém, também conversamos sobre temas gerais, como o aquecimento global e os atentados recentes em Paris e as consequências da emigração de refugiados sírios para a Europa Ocidental.

Almoço caprichado no restaurante da FIOCRUZ.


Após o almoço, despedimo-nos da Lúcia e das demais pesquisadoras e iniciamos uma visita guiada com Anunciata pelos prédios históricos do campus da instituição, com ênfase especial ao Castelo da FIOCRUZ.  Do meu ponto de vista, foi de longe a parte mais gratificante deste dia que passamos em Manguinhos, mesmo considerando que eu simplesmente adoro falar sobre ficção científica e divulgar esse gênero que produz em meu cérebro efeito análogo ao da cocaína.  Anunciata nos contou detalhes preciosos da história da instituição e da vida e da carreira de Oswaldo Cruz e Carlos Chagas.  Adoramos contemplar a coleção de charges e caricaturas coligidas pelo próprio patrono da instituição, quando de seu combate heroico à epidemia de febre amarela que grassava no Rio de Janeiro e no Brasil como um todo no início do século passado, antes, durante e depois da Revolta da Vacina (1904).  Fomos autorizados a utilizar o elevador do Castelo, o primeiro a ser instalado no Brasil.  Do quinto andar, contemplamos a vista magnífica do topo do Castelo, de onde se descortina boa parte da cidade e de onde se pode abarcar toda a extensão do instituto, que se revelou ainda maior do que supúnhamos até então.  Visitamos a Biblioteca de Livros Raros e avistamos a mesa em redor da qual os grandes sanitaristas de um século atrás se reuniam para discutir a política nacional de saúde.  Concluímos nossa visitação na antiga cavalariça, hoje desativada, onde os equinos eram inoculados para a produção de soro antipestoso.

Visita ao Castelo da FIOCRUZ.

Cláudia Quevedo Lodi, Ieda Tucherman e Anunciata Sawada.

Torre do Castelo.

Visão interna do Castelo.

Visão do topo.

Torre, ameias e merlões.

Cúpula de bronze.

Biblioteca de Livros Raros.

Castelo: de dentro para fora.

Castelo: acabamento arquitetônico primoroso.

Torre do Relógio.


Enfim, às 15h45, embarcamos na condução que nos traria de volta para casa.
Um dia inesquecível passado em uma das instituições de ensino e pesquisa mais importantes do país.  Nesta época em que vivemos tempos de desesperança ante a situação política, econômica e ética do país, passar um dia num pedacinho do Brasil em que, conquanto não seja perfeito, tudo funciona muito bem, como todo o resto do país deveria funcionar, constituiu uma experiência de lavar a alma.

Jardim Botânico, Rio de Janeiro, 19 de novembro de 2015 (quinta-feira).


Participantes:
Anunciata Sawada
Cilmar Castro
Cláudia Quevedo Lodi
Gerson Lodi-Ribeiro
Ieda Tucherman
Lucas Rocha
Lúcia de La Rocque
Naelton Araújo



[1].  Aliás, esse é o título de um ensaio de Ieda, que pode ser encontrado aqui:

Nenhum comentário:

Postar um comentário